Congregação Santíssimo Sacramento

Província Nossa Senhora de Guadalupe

O Amor Exagerado em Tempos de Coronavírus

A pandemia do novo coronavírus se estabelece como uma crise que vem nos levando a um processo intenso de reflexão, solitude, fé e de olhar para dentro de nós mesmos, como forma de nos encontrarmos com o outro, ou seja, com aquele que nos complementa. Um encontro amoroso com Deus e com o próximo.

As autoridades da área da saúde vêm nos alertando sobre a gravidade da pandemia. Apesar disso, é importante que entendamos o momento de crise como caminho para repensarmos nosso estar-no-mundo, nos aproxiarmos, ainda mais, de Deus e praticarmos o “amor exagerado”, como nos ensina Santo Eymard, através da oração, do cuidado com o outro e da partilha de experiências de vida.

Pensando nisso, o Boletim Sacramentinos, junto ao Portal Sacramentinos, com a colaboração da leiga Terezinha Breder, iniciou uma nova série. Toda semana, enquanto durar o período de isolamento, compartiharemos mensagens e vivências de padres, irmãos, irmãs, leigos e leigas sacramentinas, como forma de estreitar a relação entre os membros da comunidade sacramentina.

Na primeira edição da série, publicamos, na íntegra, uma mensagem de Padre Eugênio Barbosa Martins, Superior Geral da Congregassão do Santíssimo Sacramento, encaminhada à toda comunidade sacramentina.

 

Queridos Irmãos, queridas irmãs!

Saudamos-vos na força e na alegria do Cristo Ressuscitado!

“O Senhor ressuscitou verdadeiramente”! Este é o grande anúncio que nós, homens e mulheres consagrados a um projeto eucarístico, somos chamados a testemunhar nesse desafiante momento histórico em que vivemos. O Memorial da Páscoa do Senhor é a nossa resposta e nosso sustento no meio das perguntas que a humanidade é chamada a responder. Não estamos sozinhos nesse caminho. Mesmo que Ele não se revele totalmente num primeiro momento ou nossos olhos ainda não estejam límpidos o bastante para reconhecê-lo, nossa experiência de fé nos assegura que o Vivente caminha conosco e vai nos ajudando a interpretar, à luz da Palavra, os acontecimentos históricos, percebendo a ação criadora e salvadora do Pai.

Esta pandemia nos atingiu sob o influxo do 35° Capítulo Geral. Um grande Dom do Senhor, que nos impulsionou a retomar, em nível pessoal, comunitário e congregacional, a experiência central da vida de P. Eymard. A oferta plena de sua vida ao Senhor, traduzida através da profissão do voto de sua personalidade, fazendo o Dom total de si, é a nossa maneira concreta de testemunharmos, hoje, a nossa consagração. 

“O amor não é senão o exagero. Exagerar é ultrapassar a lei. Portanto o amor deve ser exagerado”. (31 de outubro de 1867, PR 124).

Retomando essa síntese que P. Eymard fez de sua experiência na oferta de sua vida, cremos que ela é uma excelente via para partilharmos nossas reflexões e experiências, como Conselho Geral, com cada um de vós e cada comunidade. Exagerar no amor poderá ser nosso exercício cotidiano para crescermos na fé e na esperança de que realmente poderemos estar melhores num futuro possível, que desejamos bem próximo.

Com as experiências diversificadas de nossas origens, formação intelectual e espiritual, de valores culturais que nos identificam, nós, Conselho Geral, queremos apresentar elementos de reflexão e de partilha. Estamos enriquecidos com preciosidades de conteúdos e reflexões que nos chegam de todos os lados. Papa Francisco não se cansa de nos provocar com uma palavra forte, chamando-nos a uma consciência do momento presente e da força da fé no seu enfrentamento. Vários pastores das nossas Igrejas particulares nos brindaram com suas profundas reflexões. Alguns provinciais já nos enriqueceram interiormente com suas partilhas de vivências espirituais, contextualizadas nas realidades que os cercam. Escritores e cientistas das mais diferentes áreas estão nos atualizando e ajudando a nos abrir intelectualmente e existencialmente para uma análise mais aprofundada do mundo em ebulição, apontando alternativas. Enfim, não faltam palavras nesse momento. Nosso desejo é somar vozes no coro de quem acredita na força da vida e, conforme nossa Regra de Vida nos orienta, partilharmos o nosso modo de compreender toda a realidade humana à luz da Eucaristia.

É uma contribuição que precisa ser enriquecida com vossa experiência e vossos conhecimentos. Desejamos que essa reflexão seja a mais concreta possível e, para isso, partiremos dos elementos constitutivos de nosso esquema mental e organizacional sacramentino: Espiritualidade Eucarística, que se concretiza na construção de Comunidades Fraternas, Orantes e Servidoras, assim como na Formação, Economia de Comunhão, Administração e na partilha com os leigos e leigas associados. Há um desejo e um pedido de nossa parte para que a vossa reflexão pessoal seja partilhada em comunidade. É na comunidade que se encarna e se manifesta a real vida da Congregação. Somadas no conjunto de uma Província, essas reflexões, os conhecimentos, as provocações e partilhas das comunidades poderão nos orientar na nossa trilha eucarística, que compartilhamos com toda a humanidade.

Aceitai, pois, fazer parte desse pequeno mutirão eucarístico de partilha da palavra, das experiências e dos sonhos! Quem sabe, assim, poderemos nomear medos e incertezas que rondam nossos espaços interiores mais íntimos e, por vezes, impedidos ou temerosos de serem verbalizados. Poderemos, também, se permitirmos que o Espírito se manifeste, confirmar que sairemos realmente melhores desse choque existencial que um organismo tão minúsculo tem nos provocado.

VIDA FRATERNA EM COMUNIDADE!

Na maioria dos países onde estamos presentes, somos orientados e, em algumas situações, obrigados a ficar em casa. Em princípio, poderíamos afirmar que esse controle sanitário é uma negação do sentido da construção de Comunidade, conforme concebemos em nosso ideário vocacional como homens consagrados à Eucaristia. Em uma Congregação de Vida Apostólica, a comunidade não existe para si mesma, mas para a missão. Estamos reunidos em nome do Senhor, como Igreja, para testemunhar e servir a partir do sacramento do Amor. Ficarmos restritos no ambiente físico de nossas casas jamais traduziria uma opção de vida marcada pelo dinamismo da Eucaristia, memorial da Páscoa do Senhor. Lugar de passagem!

O pequeníssimo vírus, invisível a olhos nus, nos impõe essa contenção da expressão de nossa missão. Cada comunidade, santuário, paróquia, obra ou outra forma que nos organizarmos para expressarmos a missão estão contingenciados por limites e restrições conforme a gravidade sanitária de cada país ou região. Com isso o Espírito nos provoca na criatividade. Formas novas de expressar a missão vão nascendo. Recordemos, pois, algumas que já fazem parte do nosso universo eucarístico que professamos como estilo e opção de vida. A circunstância imposta no momento poderá nos ajudar a vivê-las com mais integridade e verdade?

Comunidade Fraterna

As justificativas de algumas comunidades para não efetivarem o compromisso de realizar reuniões comunitárias são inúmeras. Uma delas é o tempo que, dedicado a uma reunião em comunidade, poderia estar sendo doado na missão… O tempo, como construção de horário, transformou-se agora em generosidade, gratuidade, expansividade, possibilidade, ociosidade…

Reapropriar-mo-nos desse valioso instrumento que alimenta nossa identidade de consagrados, isto é, as reuniões comunitárias, pode ser fruto de uma decisão pessoal e comunitária para que, realmente, ultrapassemos essa tensão mundial e saiamos dela melhores. Caso contrário, no futuro, poderemos retornar ao normal! Porém está claro que esse “normal” é que se fez problemático. Necessitamos desse espaço/tempo para partilharmos nossa experiência de fé, nossa afetividade, nossos conhecimentos, nossos medos e nossas incertezas. Somos conhecedores de relacionamentos familiares que estão sendo desfeitos com essa imposição de estarem mais tempo juntos. O feminicídio duplicou em alguns países. Situações, antes encobertas pelo ritmo alucinado da luta pela sobrevivência puderam se manifestar. No nosso caso, pode ser, para um ou outro, a oportunidade de fazer uma verificação profunda se realmente há uma identificação com a vocação eucarística sacramentina. Nem todos os vocacionados têm a capacidade de viver em comunidade. Este é um elemento essencial de discernimento vocacional eucarístico. Podemos, então, renovar essa nossa opção e exercitá-la no nosso modo específico de estarmos juntos, descobrindo que, sem essa experiência, sem darmos o tempo devido ao encontro comunitário, jamais estaremos realizados vocacionalmente.

Padre Eugênio Barbosa Martins, Superior Geral da Congregassão do Santíssimo Sacramento.

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